terça-feira, 30 de março de 2010

"Consigo ver beleza em me refazer minuciosamente a mim e ao meu contexto. Modifico meus artigos, meus pronomes, para dizer ao mundo que gêneros há tanto quanto seres humanos. Consigo pensar em me desprender do padrão-base, mesmo que apenas momentaneamente, para possibilitar mais de uma visão sobre mim mesma (...) o sexo que faço diz respeito a mim e àquele que o experimentam"

(Léo Glück)

segunda-feira, 29 de março de 2010

EU FALO PARA MIM SOBRE ISTO

"Vai ter uma hora que eu vou ter que sair deste canto seguro do balcão. Vou ter que tomar uma atitude. Vou ter que exigir uma satisfação. E tenho plena consciência do quanto não serei querido por isso. Ouvi dizer que existem maneiras mais fáceis de ganhar a vida. Mas eu não me mantenho informado."

(Bortolotto)

domingo, 28 de março de 2010

sábado, 27 de março de 2010

"MEU CU PARA A FALTA DE OPÇÃO"


Nossa beleza e aventura futurista

Mesmo depois da morte do tempo e do espaço, a Companhia Silenciosa ainda canta o amor ao perigo, o hábito da energia e da intrepidez. Desde então a literatura exaltou uma imobilidade pesarosa, êxtase e sono. Nós exaltamos a ação agressiva, a insônia febril, o passo ginástico, a bofetada e o soco. Nada de sensíveis romances sobre necrofilia.

Nós afirmamos uma nova beleza: A beleza da velocidade e do artificial. O carro de corrida cuja capota é adornada com grandes canos, como serpentes de respiração explosivas de um carro bravejante que parece correr na metralha e a solitária boneca inflável com realísticos buracos de silicone cor-de-rosa, que são mais belos que a vitória da Samotrácia. Não há beleza fora da luta, nenhum trabalho sem caráter agressivo pode ser uma obra de arte.

Toda diva é a imagem plena da subversão ao padrão feminino extático e sem voz: toda mulher calada será por nós perseguida. Nós cantamos às grandes multidões excitadas pelo prazer e pelo tumulto; nós cantamos as canções das marés de revolução, multicoloridas e polifônicas nas modernas capitais: nós cantamos o vibrante fervor noturno de arsenais e estaleiros em chamas com violentas luas elétricas; cantamos o glitter e dança do acasalamento; pontes que transpõem rios, como ginastas gigantes, lampejando no sol com brilho de facas; a arte burlesca a wireless, as inconfiáveis fiações terrenas e a carnalidade virtual sem depositório físico; a cinta liga, o salto alto e a perna desnuda; e o vôo macio de aviões cujos propulsores tagarelam no vento como faixas e parecem aplaudir como público entusiasmado.

Preferimos ser idiotas a ficar obcecados pela morte. A nossa arte é feita de excesso, sexo, superabundância, assombro. Usamos nossos desejos verdadeiros para caminhar em direção à auto-realização, à beleza e à aventura. Nossa bomba negra explode em esperma e estalos, ervas hilariantes e pirataria, estranhas heresias xiitas e fontes paradisíacas borbulhantes, ritmos complexos, pulsações de vida, tudo o que for sem forma e raro. E, ainda, de lambuja, debochamos do fetichismo elitista de niilistas patéticos, o autodesprezo gnósticos dos intelectualóides 'pós-sexuais'.

Programa do espetáculo "Burlescas", da Companhia Silenciosa.

sexta-feira, 26 de março de 2010

PUBLICADO NO SUBSTANTIVO PLURAL

Por Marcos Silva

Amigos e amigas:

A performance de Pedro Costa, registrada na notícia sobre o Salão de Artes Visuais, pertence a uma linhagem clássica da modernidade que remonta, ao menos, a Man Ray (a bela fotografia “La prière”, de 1930, que pode ser localizada em qualquer site dedicado a esse autor) e a uma montagem do Teatro Oficina, a partir de texto de Antonin Artaud, “Para dar fim ao juízo de Deus” (um ator defecava em público, recolhia a matéria em pequena urna de acrílico, que circulava de mão em mão), sem esquecer do “Soneto do olho do cu”, de Rimbaud e Verlaine.

Certamente, é difícil comentar uma performance a partir de descrição e fotografia. Tive a impressão, sem assistir ao ato, que a cena foi superior a sua explicação pelo artista – excessivamente didática, apelando para lugares comuns. E um terço saindo do ânus é diálogo entre as partes: sacralização do órgão humano, humanização do objeto sagrado. Prefiro não reduzir a cena a uma visão degradada do ânus nem a uma visão degradante do objeto ritual religioso. Melhor encarar a humanização de tudo naquele íntimo encontro: o ânus como fonte de tudo.

Abraços a todos e todas.

Publicado aqui.

Mais no blog do grupo Destemidx.

quinta-feira, 25 de março de 2010

SOBRE O AMOR

De você eu só espero o melhor
A mão no peito antes de dormir
Uma oração silenciosa
A profunda hilariedade
Que é a vida em comum com outros
Que não são como nós
Eles não são nós dois
E nunca vão saber
Do que estamos rindo
A sabedoria de entender
Que o amor vai passar
E nós estaremos
De olhos abertos

VIDA - COMPANHIA BRASILEIRA DE TEATRO








Fotos: Bruno Tetto

SOBRE VOLTAR AO MESMO LUGAR



Eu sempre sinto medo de sair de casa. Principalmente dias antes de pegar o avião. Mas eu sempre insisto em sair. Dessa vez, eu tive medo dos problemas no meu trabalho, da questão do dinheiro, de não ser bem recebida em cidades estranhas (boas e más surpresas me aguardavam).

O negócio é que, independente disso, eu sempre sei, lá no meu íntimo, que eu preciso ir embora. Que é preciso se deslocar. Que Natal me entorpece e não é isso que eu quero. Nunca foi. Desde pequena.

Curitiba, onde eu fiquei mais tempo desta vez e onde ainda estou, me despedindo sem vontade de voltar, me irritou e deprimiu, logo de cara. Mas aí eu me apeguei um pouquinho a esse lugar. Ao movimento, ao ar de interior, mas onde você pode achar coisas completamente inusitadas (São Paulo é uma cidade adorável, mas uma cidade de malucos. Quem vai pra lá precisa saber disso), ao Centro bonito e cheio de gente, a noite que nem tá tão fria assim essa época.

Aqui eu conheci o Bortolotto, o que mudou minha perspectiva em uma série de coisas. Quer dizer, não é preciso se importar de verdade. Eu sou apenas o que sou.

Mas eu resolvi escrever isso aqui só pra falar sobre o espetáculo "Vida", da Cia. Brasileira de Teatro, que é da cidade. Ele fala sobre quatro pessoas que estão presas em um lugar. E esse lugar faz parte delas, mas elas estão presas. Eu também me sinto assim e, por isso, vou voltar meio à contragosto. E o medo de esse sol todo me amolecer?!

Eu volto pensando que o melhor de Natal são as pessoas que eu, muito sabiamente, deixei/fiz com que me cercassem. Tem o meu menino Yuri, tem o Juão que eu só pude conhecer melhor aqui, tem o Sandro e a energia toda dele (isso já me alimenta) e a sombra da casa dele também, tem o Paulo e o nosso sentimentalismo compartilhado, tem a Débora e as muitas, muitas risadas que eu dou com ela (eu sempre vou pra casa achando que tudo é mais feliz). Tem mais gente que eu não vou falar aqui.

São só vocês que me mantêm na terra das pinturas de cajus.

"Se o sol se cansa/E a noite lenta/Quer ir pra cama/Marmota sonolenta/Eu, de repente/Inflamo a minha flama/E o dia fulge novamente/Brilhar para sempre/Brilhar como um farol/Brilhar com brilho eterno/Gente é pra brilhar/Que tudo mais vá pro inferno/Esse é o meu slogan/E o do sol" (Maiakovski)

quarta-feira, 24 de março de 2010

SOBRE O GASTO DE ENERGIA A TOA


Eu entendo (guardadas as devidas proporções) as manifestações de ódio que cercaram a performance do Pedro Costa no Salão de Artes Visuais de Natal. As religiões dão às pessoas um lugar no mundo e, enfim, "profanar" (estou usando palavras alheias, não considero profanação) um terço é demais pra cabeça da maior parte delas.

E exatamente por ser muito pra mentalidade alheia é que a "Rosário do Anus" se torna significativa e levanta as questões que se propõe a levantar.

Para mim, por exemplo, a pergunta que fica é: Pra que tanto gasto de energia à toa? Eu nunca vi ninguém esbravejando por causa da chacina da Candelária, eu nunca ouvi falar de ninguém ser ameaçado porque roubou dinheiro público.

Quer dizer, em última instância, a ação do Pedro é uma coisa que só prejudica/beneficia ele mesmo. Se você católico, evangélico, ou o que o valha, quiser ignorá-lo, pode continuar lendo sua bíblia e frequentando seus ritos sem nenhum empecilho. Vejam que de forma prática a performance citada não gera absolutamente nada.

Então pra que todo esse chilique? Algum problema com o seu próprio cu (sério)? Você tem medo de as manifestações cristãs acabarem por conta de uma performance realizada em Natal/RN? (Tome nota que o próprio Papa deve ter coisa mais séria pra se preocupar).

Por favor, senhores mal resolvidos, direcionem sua raiva pra algo mais produtivo, como criticar a prefeita retardada, participar de algum movimento social ou, simplesmente, ver um filme que ampliem mais o mundo de vocês. Porque é evoluindo que a gente vai viver melhor em sociedade e não condenando manifestações artísticas sem sequer parar pra pensar no que se diz.

P.S.: Acho o problema com o anus em si um tópico à parte. O mal foi ele tirar o rosário do cu? Se você da boca ou da orelha não ia ter problema? Não. Aí ia ser considerado um truque de mágica. Olha só que coisa.

Foto: Tom Zé com uma bolinha no dito cujo, na capa do seu CD "Todos os olhos". Será que ele sofreu ameaças por isso?